28 Março 2024, Quinta-feira
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A Misericórdia do Montijo – Fundação, Heráldica e Museu

Não se conhecem quaisquer fontes documentais que nos permitam datar com segurança a fundação da Misericórdia do Montijo. Segundo Costa Goodolphim (As Misericórdias, Lisboa, Imprensa Nacional, 1897, p. 229), esta Misericórdia teria sido fundada em 1520.

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O Padre António Carvalho da Costa aponta o ano de 1553 para a fundação da sua Igreja (Corografia Portugueza, tomo III, Lisboa, na Oficina Real Deslandesiana, 1712, p. 344) e o Prof. Doutor Vítor Serrão afirma que a Misericórdia já existia em 1555 (Tomás Luís e o Retábulo da Igreja da Misericórdia, Montijo, Câmara Municipal/ Ed. Colibri, 2005, p. 25).
Logo nos seus primórdios, a Misericórdia do Montijo anexou os bens e as obrigações da antiga Albergaria e Hospital do Espírito Santo, com existência documentada desde 1489. Uma carta régia de D. Sebastião, datada de 13 de Outubro de 1574, ordena precisamente esta anexação, dando despacho a um requerimento enviado pelos oficiais da Câmara da vila (IAN/TT, Chancelaria de D. Sebastião e D. Henrique, liv. 9, f. 58 r-58 v).
Na designação desta albergaria e hospital do Espírito Santo encontrámos o motivo principal para um dos trabalhos que tomámos em mãos, aquando da nossa passagem pela Mesa da Misericórdia, na qualidade de seu secretário (2005-2011): a concepção e concretização de um novo ordenamento heráldico da Santa Casa. A proposta, depois de apresentada e aprovada em Mesa, foi, definitivamente, aprovada em Assembleia Geral da Misericórdia, realizada em 17 de Março de 2011. Nesta proposta a pomba – representação milenária do Espírito Santo – assume o papel de simbologia principal, secundado pela vieira, símbolo da Ordem Militar de Santiago a quem estes domínios pertenciam. A concretização desta proposta de ordenamento heráldico só foi possível graças ao meritíssimo trabalho de execução levado a cabo, a título gracioso, pelo eminente heraldista, o tenente-coronel José Manuel Pedroso da Silva, e pela aquisição dos serviços do iluminador do Exército, o mestre José Colaço, autor dos desenhos.
Mas voltemos, ainda aos inícios desta secular instituição. Os primeiros testemunhos documentais sobre a existência de uma Misericórdia, na então vila de Aldeia Galega do Ribatejo, actual Montijo, remontam ao ano de 1568 (4 de Janeiro), data em que o mestre pedreiro Fernão Fidalgo passa quitação a Nuno Álvares Pereira, mesário da Misericórdia, da quantia de 2.000 reais, por adiantamento da obra de pedraria do portal principal da Misericórdia, obra só concluída em 1577.
Desconhecemos a data e o local de nascimento de Nuno Álvares Pereira, considerado o fundador desta Misericórdia. A sua morte teria ocorrido, provavelmente, na Aldeia Galega do Ribatejo, no ano de 1588, facto que, na ausência de registos paroquiais de óbitos de Aldeia Galega do Ribatejo, entre os anos de 1581 e 1597, não foi possível confirmar.
A sua qualidade de provedor só a pudemos documentar em 1 de Fevereiro de 1573, data da reunião da Misericórdia realizada nas suas casas de morada e onde foi aprovada a construção de um altar numa sala da mesma, para se poder dizer missa, enquanto a construção da Igreja da Misericórdia, autorizada por carta régia de 17 de Julho de 1571, não se concretizasse.
Diz a acta desta mesma reunião, a mais antiga que se conhece desta Misericórdia: “… loguo pelo dito nuno allvarez provedor foi dito que tendo elle detriminado de se fazer casa de misericordia nesta villa em hum seu asente de casa, elle ouvera lisemsa del Rei nosso senhor e do arsebispo pera se poder fazer e dizer misa numa sua salla das ditas casas pera o que era nesesario fazer hum altar…”(AMMTJ, Arquivo da Misericórdia do Montijo, Actas, 1573-1632, doc. n.º 4, fol. 2 r).
Nuno Álvares Pereira foi casado com Isabel de Almeida, de quem não teve filhos, tendo legado à Misericórdia, por testamento de 3 de Agosto de 1569, as casas de morada (hoje, Igreja e Museu da Misericórdia) e o terreno anexo às mesmas (hoje, Hospital Distrital do Montijo).
E foi precisamente onde o provedor Nuno Álvares Pereira anunciou a sua determinação em “se fazer casa de misericórdia nesta villa” que hoje existe, para além da Igreja, o Museu da Misericórdia. Nesta antiga casa do despacho, nasceu em 2008 um museu de arte sacra da Misericórdia, inaugurado pelo senhor Bispo de Setúbal, em 29 de Março de 2008, no decurso da tomada de posse da Mesa Administrativa para o triénio 2008-2010.
Foi obra considerada pela Mesa Administrativa como marcante do seu mandato (triénio 2005-2007) e trabalho que muito nos honra ter coordenado, na qualidade de Secretário da Mesa e as funções que me foram conferidas de “coordenação e inventariação do espólio documental e iconográfico da Misericórdia”.
E o objectivo foi o de tentar completar o trabalho de recuperação da Igreja e do seu espólio, encetado em mandatos de Mesas anteriores, particularmente do mandato do provedor Mário Miguel de Sousa Rama, e durante o qual a igreja teve relevantes obras de remodelação e foi encontrada a importante pintura atribuída a Tomás Luís, a “Visitação de Nossa Senhora” considerada a mais importante obra de arte existente na Igreja da Misericórdia.
Este trabalho de musealização do espólio existente na Igreja foi iniciado em 2005 e prolongou-se até 2008, data da inauguração do Museu.
Durante este período, foram contratados os serviços de diversos técnicos especializados nas áreas do restauro, nomeadamente: em 2006, a técnica de restauro Maria José Francisco, para nos restaurar a tela “Painel da Visitação”, trabalho elaborado por Manuel António de Araújo, no ano de 1808 – tela essa que andava transformada em rodilha e que, por sorte, não fora jogada no lixo; ainda, nesse mesmo ano de 2006, foi contratado o restaurador António Manuel Seródio Lopes para proceder ao restauro dos artefactos em madeira, nomeadamente, as varas de pálio, os tocheiros e o antigo gradeamento do altar; foram, igualmente, contratados os serviço de carpintaria, de instalação eléctrica e de instalação de central de segurança; ainda, nestes trabalhos de restauro de alfaias e paramentos religiosos, e já depois da inauguração do Museu, foram contratados os serviços da restauradora de têxteis, Dr.ª Madalena Campos Costa, para o restauro de 2 umbelas, que se encontravam em muito mau estado de conservação; e foram, igualmente, adquiridas vitrinas apropriadas para imagens e alfaias litúrgicas de prata. Por minha sugestão, e no arranque destes trabalhos, em 2005, a Mesa Administrativa contratou os serviços do Sr. Joaquim Baldrico para prestar apoio a este projecto, apoio que apesar de muito curto foi relevante.
Chegados à obra – um museu de arte sacra, importante património cultural do Montijo, ainda no desconhecimento de muitos montijenses – resta-nos, ainda, uma sugestão: por que razão não se dá o nome do provedor Nuno Álvares Pereira a este museu, no local que fora sua casa de morada? Apesar de já ter sido nome de avenida, a actual avenida dos Pescadores, e de ser, hoje, nome de rua, a do Lar da Misericórdia, o fundador de uma instituição como a Misericórdia, das mais antigas do nosso concelho, é merecedor de mais esta homenagem.

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